quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Uma pedagogia alternativa

A pedagogia Waldorf, introduzida em Portugal em 1984, aposta na liberdade de desenvolvimento das crianças, valorizando nos primeiros sete anos de vida o aspeto sensorial, em detrimento do intelectual.
Trabalhar a favor e não contra a tendência natural das crianças para serem ativas, valorizar as experiências sensoriais nos primeiros anos de vida e viver ao ritmo das estações do ano, são alguns dos princípios da pedagogia Waldorf, ainda pouco divulgada em Portugal.
De facto, apenas dois jardins de infância portugueses incluem atividades como modelar cera de abelhas, costurar panos coloridos, amassar e cozer pão, trabalhar com materiais naturais, como troncos de madeira, conchas e cortiça, ou tratar da horta e do jardim. Estas são atividades que, segundo a corrente pedagógica Waldorf, desenvolvem os sentidos das crianças, estimulam a imaginação, a vitalidade e a alegria de viver, apostando sempre numa maior ligação e respeito pela Natureza.
Ana Abreu, fundadora do Jardim de Infância S. Jorge, em Alfragide, onde se encontram crianças entre os 4 meses e os 6 anos, introduziu esta pedagogia alternativa em Portugal, em 1984. Segundo explica esta educadora, a abordagem que o método Waldorf faz nos primeiros anos de vida centra-se mais no desenvolvimento motor e sensorial da criança, deixando para segundo plano os aspetos intelectual e cognitivo.
"É muito importante que as crianças brinquem livremente e que expressem aquilo que elas realmente sentem, ou seja, não a partir das nossas agendas, mas a partir daquilo que elas necessitam desenvolver e criar".
A formação Waldorf inclui as vertentes científica, artística e estética. "A nossa prioridade é que a criança se revele como um ser único, e portanto aquilo que lhe damos enquanto ambiente educativo é para ela se desenvolver de acordo com a sua própria vontade, com o que sente que precisa. Isso não quer dizer, no entanto, que ela não tenha limites no seu processo de desenvolvimento", afirma.
Ana Abreu prefere usar o termo "processo de desenvolvimento" a "processo educativo", porque acredita que as crianças não se educam: "Há certos parâmetros que são comuns a todos nós, mas há outros que são completamente individuais, que não são educáveis, antes pelo contrário, são aquilo que cada criança traz. Um aspeto individual que é único e com o qual todos nós também aprendemos", explica a responsável.
Mais a sul, no concelho Lagos, a alemã Eva Herre fundou em 1992 o Jardim Infância Viva, em Barão de São João, que atualmente conta com 30 crianças.
Além da vertente artística, Eva Herre salienta também que a pedagogia Waldorf está muito enraizada no respeito e na admiração pelo Mundo, incutindo nas crianças a capacidade e a responsabilidade de intervir na preservação da Natureza. "Os pais que procuram o nosso jardim de infância desejam que os seus filhos tenham uma formação com mais liberdade e em harmonia com a Natureza, saudável para o corpo, a alma e o espírito."
Para a diretora do Jardim Infância Viva, o sistema Waldorf não é só uma pedagogia, é também um método e uma atitude que tem a ver com uma forma global de encarar o Mundo. "É importante dar tempo e espaço suficientes para uma aprendizagem sem competição e sem pressas. A pedagogia Waldorf é um movimento mundial com uma forte abordagem multicultural, que torna as crianças mais autónomas e responsáveis, com consciência étnica e respeito pela diversidade, procurando formas de se integrar e participar numa sociedade saudável", explica.
No Jardim Infância Viva, a alimentação é constituída por pratos vegetarianos e o ambiente é internacional, mas Eva assegura que o ensino tem como base a língua e a cultura portuguesas.
É precisamente nesta questão que se reflete a única preocupação relativamente a esta pedagogia manifestada por Teresa Vasconcelos, diretora do Departamento de Educação de Infância e Especializações Educativas da Escola Superior de Educação de Lisboa. "O modelo de Waldorf é interessante, nomeadamente porque é contracorrente e procura uma pedagogia alternativa, mesmo ao nível da alimentação. Mas, obviamente, não será indicada para todas as crianças, porque é necessário que as próprias famílias também se encontrem inseridas nessa lógica de pensamento, seguindo um estilo de vida alternativo, com menor consumismo e maior ligação à Natureza."
Teresa Vasconcelos entende também que na aplicação ao contexto português, a pedagogia de Waldorf deveria ultrapassar os aspetos específicos do país de onde é originária (Alemanha). Deveria ser "mais permeável à realidade portuguesa e às nossas tradições, fazendo uma maior aculturação ao contexto português", afirma a responsável.
Fundada por Rudolf Steiner em 1919, em Estugarda, na Alemanha, inicialmente através de uma escola para os filhos dos operários da fábrica de cigarros Waldorf-Astória, a pedagogia de Waldorf distinguiu-se desde o início por ideais e métodos pedagógicos até hoje considerados revolucionários.
Atualmente existem mais de 700 escolas em todo o Mundo que trabalham com a pedagogia de Waldorf, sendo que em Portugal apenas os dois jardins de infância referidos neste artigo e uma escola de educação especial, em Seia, recorrem a esta pedagogia.

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